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quinta-feira, 23 de maio de 2013

A Raquel e o Martim



Ela é uma historiadora de sucesso, que tem não sei quantos livros publicados, resmas de artigos científicos, é convidada para tudo quanto seja conferências, encontros científicos, colóquios internacionais, em suma, um currículo de reconhecido mérito.

Ele é um puto de 16 anos, que teve uma ideia de negócio e pô-la em prática.

Ela questiona o miúdo sobre os salários miseráveis de quem fazia os produtos que ele negociava e ele, sem hesitação, desarmou-a com um argumento que, mesmo discutível, bastou para as circunstâncias. Nem lhe assistia a ele, responder pelas injustiças sociais que por aí grassam.

O puto virou herói e a investigadora, vilã.  

Vêm depois, procurando reabilitar a imagem humanista da senhora professora, dizer que o garoto afinal era aldrabão, que tinha um pensamento igualzinho ao dos administradores dos grandes hipermercados (que dizem que é melhor ganhar pouco do que estar no desemprego e com esse argumento, continuam a pagar ordenados mínimos e a escapar aos impostos sobre os enormes lucros).

Onde é que isto já vai!!!

Alguém estaria à espera que o puto, se puder comprar a 10, vai comprar a 20, porque este preço é que paga salários condignos e direitos sociais? Essa função, penso eu,  não será do indivíduo, mas do Estado.

Este episódio fez reacender a luta entre aqueles que se aproveitam da mão-de-obra barata para ter lucro; aqueles que pretendem ganhar mais porque geram riqueza; aqueles que pagam pouco porque o negócio não dá para pagar mais e aqueles que sabendo que o negócio não dá, continuam a exigir salários mais dignos.

Ora, se tirarmos os primeiros e os últimos deste "filme", não se pode dizer que haja injustiça nos que ficam no meio.

Agora, se houver quem consiga fazer contas de outra maneira, faça favor.


4 comentários:

Horticasa disse...

Um milhão de pobres fazem um rico, quantos pobres há em Portugal para cada rico??
fica a pergunta para os espertos.
beijinho

Fernando Andrade. disse...

Essa é fácil, Eugénia : Um milhão.
Mas não era bem estas contas que eu sugeria.
Beijinho.

Anónimo disse...

Fernando,

Aqui está a velha questão entre a Teoria e a prática. Teórica e filosoficamente estou de acordo com a professorazeca, como alguns lhe chamaram, porém, não na totalidade da sua intervenção. Na prática, não posso estar mais de acordo com o puto brilhante, como alguns, também lhe chamaram.

Na prática, estou com o puto, porque é de realçar que este jovem não se “encoste” aos pais, não passe as noites agarrado à televisão e ao computador, e os dias a dormir, como há milhares de jovens por aí… É de salientar o seu dinamismo e o desejo de independência. Agora, espero que não seja ganancioso, não comprometa os seus estudos (hoje em dia há dúvidas se é tão importante assim, mas acho que o saber não ocupa lugar e é sempre bom e melhor saber mais) e saiba escolher as melhores parcerias, procurar trabalhar com empresas idóneas que respeitam os seus empregados, e que não se deslumbre e saiba sempre respeitar a sua palavra e os seus compromissos empresariais.

Digo isto porque, ainda não há muito tempo houve uma grande vaga de gente empreendedora (como agora se diz e naquela altura não se dizia assim) o que levou a que qualquer borra-botas passasse a ser “empresário”. Arranjaram até o Simplex, lembram-se? O problema era quando a coisa corria para o torto e os adjudicatários dos vários trabalhos em curso não pagavam, e o tal sonhador, borra-botas empreendedor, naturalmente não tinha capital e, chegado o fim do mês, dizia para os seus vários trabalhadores, muitos deles chefes de família, que tinham vários compromissos a pagar e filhos para sustentar: “ Eles ainda não pagaram e eu também não posso pagar…”

Teórica e filosoficamente estou com a professorazeca, porque percebo perfeitamente a sua linha de pensamento, mas acho que foi infeliz com o endereçado. Aquela mensagem tem todo o cabimento, mas não é para ser dita, nem naquele momento e, muito menos, àquele jovem com 16 anos…

A resposta do Martim, seguida de palmas da plateia: “ É melhor receber o ordenado mínimo do que estar no desemprego!...” mas não será, precisamente este o raciocínio dos empresários da Tailândia, Bangladeche e China, e que nós teoricamente tanto criticamos por não respeitarem os Direito Humanos, quando pagam os tais 2 dólares por dia aos seus explorados trabalhadores?… Mas que nós, na prática, não queremos saber, e se podermos comprar uns ténis de marca por 50€, não vamos pagar 120€ por uma qualquer marca europeia onde os seus trabalhadores são respeitados e se cumprem escrupulosamente as regras laborais!

Uma coisa é a teoria, outra, muitas vezes bem diferente, é a prática!

Um Abraço!

Orlando Duarte

Fernando Andrade. disse...

Nem mais, Orlando.Obrigado pelo teu oportuno e esclarecido comentário.
A teoria diz que é mais humano distribuir a riqueza produzida irmãmente entre aqueles que a produzem, mas na prática, a maior parte das vezes isso não acontece, umas vezes porque não há distribuição, outras vezes porque não há produção.
Mas os desequilíbrios acentuam-se quando se abre as fronteiras a mercados onde não se respeitam os direitos humanos, para concorrer com os ocidentais. Faz-me uma certa confusão como é que se deixou isso acontecer, como se não previssem que isso iria gerar o encerramento do nosso tecido produtivo e a redução drástico do emprego.A função reguladora do Estado deixou de se exercer e passou a ser a iniciativa individual a entrar em acção, numa espécie de "salve-se quem puder". Em terra de cegos, quem tem um olho é rei.
Abraço.